Reeducanda ganha 1ª certidão de nascimento em presídio alagoano

A certidão de nascimento é o primeiro passo para a aquisição da cidadania. Com ela, é possível ter acesso a direitos e garantias constitucionais. Porém, para a reeducanda Esmeralda Bezerra, a cidadania só chegou aos 31 anos de idade, quando ela conseguiu seu primeiro registro civil de nascimento, e dentro do sistema prisional alagoano, onde Esmeralda passou a existir de fato e de direito.

Com a certidão, ela também já garantiu acesso aos demais serviços ofertados pela gestão prisional com vistas à ressocialização.

A emissão do documento só foi possível graças ao trabalho realizado pelo Balcão Cidadão, setor da Secretaria da Ressocialização e Inclusão Social (Seris) responsável por resgatar a cidadania dos apenados que se encontram no sistema prisional alagoano. Viabilizada por meio de parcerias, a emissão de documentação civil garante acesso aos programas de assistência social voltados à população privada de liberdade.

Além da Certidão de Nascimento, o Balcão Cidadão também viabiliza a emissão de RG, CPF, certidões de casamento e divórcio, declaração de união estável, certidão de óbito e reconhecimento de paternidade. Outras facilidades são a abertura de contas bancárias de movimentação e pecúlio, destinadas aos reeducandos que trabalham no próprio sistema prisional.

A coordenadora do Balcão Cidadão, assistente social Michele Farias, recorda como a Seris constatou a ausência de documentação de Esmeralda. “A assistente social do Presídio Feminino Santa Luzia entrou em contato conosco para relatar que a reeducanda Esmeralda não estava tendo acesso aos certificados dos projetos nas áreas de educação e de trabalho desenvolvidos no sistema prisional por não possuir nenhuma documentação civil, já que ela tinha dado entrada na penitenciária portando documentação falsa. Foi quando o Serviço Social da unidade fez um relatório explicando a situação e encaminhando o caso para o Balcão Cidadão, que, por sua vez, iniciou o processo de resgate da cidadania da reeducanda”, conta Michele.

A primeira ação do Balcão Cidadão foi buscar documentos que subsidiassem a possível abertura de ação judicial para o registro tardio de nascimento da custodiada. “Fizemos buscas em seis cartórios circunvizinhos à região na qual a apenada relatou ter nascido, o município de São José da Laje. No entanto, nada foi encontrado. Também solicitamos o exame de papiloscopia forense (identificação civil por meio das impressões digitais) ao Instituto de Identificação, mas nenhum registro foi encontrado no banco de dados. Foi quando resolvemos entrar em contato com a Defensoria Pública Estadual visando à elaboração de petição inicial da Ação Civil de Suprimentos da Certidão de Nascimento. Após alguns meses de espera, conseguimos a emissão deste documento”, explica a coordenadora.

Direitos garantidos

“Com a certidão de nascimento em mãos, Esmeralda vai ter acesso a todos os serviços ofertados aos reeducandos, como a participação em cursos profissionalizantes e acesso a programas destinados a geração de emprego e renda, por meio das oficinas de trabalho desenvolvidas pela Seris”, reforça a assistente social, revelando, ainda, a existência de outros três casos – todos aguardam decisão judicial – de emissão de Certidão de Nascimento no complexo penitenciário, beneficiando dois internos do Centro Psiquiátrico Judiciário (CPJ) e um apenado da Penitenciária de Segurança Máxima (PenSM).

Já Esmeralda não esconde a felicidade em portar documento tão importante. “Eu nasci em casa, na zona rural de São José Laje. Meus pais eram muito humildes e nunca se preocuparam em tirar meus documentos. Quando cheguei à adolescência, comecei a seguir o caminho errado. Já quando fiquei maior de idade, resolvi adquirir uma identidade falsa, mas nunca perdi o desejo de ter o meu documento oficial, com o nome e sobrenome que meus pais me deram”, relata a reeducanda.

Agora, Esmeralda está prestes a realizar o sonho de oficializar o relacionamento com a companheira que conheceu dentro da própria unidade prisional. “Estou muito feliz. Finalmente terei acesso a todos os benefícios do estudo e do trabalho, além da remição de pena. Só tenho a agradecer pelo empenho do setor de Assistência Social da unidade, que me ajudou neste processo. Já posso sonhar com uma oportunidade de trabalho quando deixar a prisão”.

Balcão Cidadão

Criado em 2012, o Balcão Cidadão é uma central de atendimento da Seris que busca resgatar a cidadania do apenado por meio da viabilização da emissão da documentação civil à pessoa privada de liberdade. Entre os documentos viabilizados estão certidão de nascimento, certidão de casamento, Registro de Identificação, CPF e abertura de conta movimento e pecúlio.

Para tal, foram firmadas parcerias com várias instituições, como Tribunal de Justiça, Instituto de Identificação, Defensoria Pública, Receita Federal, Ministério do Trabalho e Emprego, Tribunal Regional Eleitoral e Caixa Econômica Federal.

“O Balcão Cidadão é um trabalho pioneiro que garante a cidadania para vários custodiados alagoanos. Este projeto é desenvolvido por assistentes sociais que atuam diariamente no sentido de ofertar cidadania ao custodiado, por meio de mutirões destinados à emissão de documentos, além do atendimento aos familiares. A documentação civil constitui um dos principais instrumentos de acesso aos direitos sociais, permitindo, assim, que os apenados possam exercitar sua cidadania”, destaca o secretário da Ressocialização e Inclusão Social, coronel PM Marcos Sérgio de Freitas.

As ações do setor são desenvolvidas de forma contínua e acontecem de duas formas. Por meio da solicitação de documentação civil, feita pelo setor psicossocial das unidades prisionais, que realizam a entrevista com o custodiado logo quando ele ingressa no sistema, sendo verificado se há alguma pendência documental. Em se confirmando a pendência, a demanda é encaminhada para que o Balcão Cidadão, que, então, viabiliza a emissão.

A outra forma se dá pela solicitação de parentes dos custodiados que tenham interesse na emissão ou regularização dos documentos civis de seus familiares encarcerados. Em oito anos de atuação, o Balcão Cidadão já entregou mais de sete mil documentos, sendo quase duas mil declarações de união estável e mais de mil RGs.

 

Texto de Janaina Marques

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