Os percalços do relator começaram pela manhã, quando os ministros discutiram a possibilidade de usar no processo depoimentos relacionados à Odebrecht, que indicavam claramente que a empreiteira realizou pagamentos ilícitos para a chapa Dilma-Temer no pleito de 2014. A discussão se deu após um pedido preliminar da defesa, que ressaltava que a petição inicial da investigação, feita pelo PSDB e pela sua coligação Muda Brasil, não falavam de irregularidades da Odebrecht e, sim, da Petrobras. Por isso, argumentavam, a investigação devia se circunscrever ao pedido inicial e não extrapolá-lo.
A longa discussão, que durou quase quatro horas, acabou empatada. Três ministros foram a favor do uso dos depoimentos dos delatores e três contrários (Admar Gonzaga, Tarcísio Vieira e Napoleão Nunes Maia, os dois primeiros recentemente indicados pelo próprio Temer para a corte e o último um oponente contumaz de Benjamin no Supremo Tribunal de Justiça). O desempate só ocorreu no início da tarde, quando Gilmar Mendes, o polêmico magistrado que preside a Corte, emitiu seu voto de minerva. Ele concordou com os argumentos da defesa, algo já era esperado.
Em sua fala, Benjamin chegou a dizer que o processo não poderia sobreviver sem a presença das doações da construtora. “Essa ação não poderia existir sem a inclusão da matriarca chefe dessa manada de elefantes, que é a Odebrecht”, afirmou. Aos poucos, Benjamin começou a desenhar seu caminho. Ao citar depoimentos de figuras como Augusto Mendonça Neto, da Toyo Setal, Paulo Roberto Costa, ex-diretor da Petrobras e Sérgio Machado, ex-presidente da Transpetro, que também são delatores na Lava Jato, ele afirmou que existia uma “propina poupança” ou “propina gordura” envolvendo o dinheiro desviado da Petrobras. Segundo ele, os autos da investigação demonstram que os acordos entre os políticos e empreiteiras envolvidas em obras da petrolífera foram “jogados para o futuro”. E que os financiadores criaram contas correntes para o depósito continuado de propina e de caia dois que permaneciam à disposição dos partidos ou candidatos para quando quisessem usar.
A distinção sobre a disponibilidade permanente do dinheiro é importante para a tese do relator, já que os delatores não indicaram que houve pagamento de propina para a campanha de 2014 com dinheiro da Petrobras -só havia indícios disso envolvendo a Odebrecht. Benjamin indica com isso que o dinheiro da propina, ainda que tenha sido depositado anos antes como afirmaram os depoentes, permaneceu em contas que eram alimentadas constantemente. E elas eram repassadas para os partidos, que distribuíam verba para diversas campanhas, incluindo a da chapa Dilma-Temer. O dinheiro da corrupção, aponta Benjamin, uniu-se a dinheiro honesto em contas voltadas para partidos e, por isso, é impossível separar o que era propina e o que não era dentro delas. Ele destaca ainda que já que esse dinheiro foi usado para a campanha, a eleição aconteceu em nível de disparidade com os outros concorrentes e, por isso, a vitória foi irregular. “Se os partidos X e Y receberam o mesmo valor de 100 reais em 2014, quem terá vantagem na campanha? Aquele que já tinha uma longa poupança acumulada ou aquele que conta só com os 100 reais?”, afirmou Benjamin.
O relator também tenta provar que, apesar de os depoentes terem afirmado que os repasses irregulares eram feitos a partidos políticos, esse dinheiro era usado, sim, na campanha. É o que ele chamou de “irrelevância da fonte de financiamento”. “Esses partidos doam dos seus cofres para os comitês de campanha”, destacou o relator, que afirmou que na campanha de 2014, o segundo maior financiador de campanha foi a Direção Nacional do PT, com um valor de 31 milhões de reais e que mais de 60% de toda a arrecadação partidária do PMDB em 2014 foi direcionada às campanhas eleitorais. “Se há ilicitudes na alimentação [das contas] dos partidos, não há como separá-la da alimentação das campanhas”, destacou.
A tese, entretanto, já encontra argumentos contrários por parte da defesa, que afirma que já estava preparada para este posicionamento do relator, diante da retirada dos ilícitos ligados à Odebrecht do processo. “O ministro Herman não encontrou nenhuma ilegalidade em 2014 que tivesse na petição inicial e teve que buscar ilegalidades em anos anteriores, 2006, 2008, 2010, 2012. Só que ilegalidades anteriores não são objeto deste processo, que é a eleição de 2014. Esse processo versa sobre 2014. Só podemos tratar de 2014”, afirmou o defensor de Temer, Gustavo Guedes, após o fim do terceiro dia. “Não há nada neste processo. Por isso a defesa do presidente Temer confia na improcedência integral dessa ação”.
Nesta sexta-feira, o embate, ao menos dentro do TSE, deve chegar ao fim. O ministro Herman Benjamin deverá, finalmente, declarar seu voto pela manhã e depois escutará seus pares que, ao que tudo indica, devem mesmo absolver o presidente Michel Temer, dando um pouco mais de fôlego para que ele enfrente a atual crise política. A previsão é que o resultado se dê até a hora do almoço.