Intervalo antes da refeição
escolar traz benefícios aos alunos

Será que algo tão simples como o tempo de intervalo poderia fazer a diferença no comportamento e na saúde de uma criança?

Alguns especialistas acham que sim, e agora algumas escolas estão reagendando os intervalos –liberando os estudantes para brincar antes de se sentarem para o almoço. A troca parece ter causado algumas mudanças surpreendentes, tanto na cantina quanto na sala de aula.

Escolas que realizaram essa mudança de horário relatam que, quando as crianças brincam antes do almoço, há menos desperdício de comida e maior consumo de leite, frutas e vegetais. Além disso, alguns professores contam que há menos problemas de comportamento.

“As crianças ficam mais calmas quando saem para o intervalo antes”, disse Janet Sinkewicz, diretora da Escola Primária Sharon, em Robbinsville, New Jersey, que fez a mudança no último outono. “Elas sentem que têm mais tempo para comer e não precisam se apressar.”

Num dia letivo recente na escola Sharon, observei enquanto alunos da segunda série corriam atrás um dos outros pelo pátio e escalavam o trepa-trepa. Quando o sinal tocou, o agitado pátio se esvaziou quase instantaneamente e as crianças se alinharam para tirar seus casacos e luvas, depois calmamente fizeram fila para o almoço na cantina.

“Toda a confusão terminou”, disse Sinkewicz.

Uma das primeiras escolas a adotar a ideia foi a North Ranch, em Scottsdale, no Arizona. Cerca de nove anos atrás, a enfermeira da instituição sugeriu a mudança e a escola conduziu um estudo-piloto –acompanhando o desperdício de comida e as visitas à enfermaria, além de relatórios sobre o comportamento dos alunos.

Ao final do ano, as visitas à enfermaria haviam caído 40%, com menos casos de dores de cabeça e de estômago. Um aluno disse a funcionários da escola que estava feliz por ter parado de vomitar nos intervalos.

Outras crianças se apressavam durante o almoço para chegar mais cedo ao pátio, deixando grande parte da comida no prato. Depois da mudança, o desperdício de alimento diminuiu e as crianças apresentaram menor probabilidade de sentir fome ou ficar doentes mais tarde no mesmo dia. E, para a surpresa dos funcionários da escola, mudar o intervalo para antes do almoço acabou somando cerca de 15 minutos às aulas em classe.

No calor do Arizona, “as crianças precisavam de um período de resfriamento antes de poder iniciar o trabalho acadêmico”, disse a diretora, Sarah Hartley.

“Economizamos 15 minutos todos os dias”, continuou Hartley, “pois as crianças podem brincar, em seguida ir à cantina para comer e se acalmar, para então retornar à classe e iniciar o trabalho acadêmico imediatamente”.

Desde aquele programa-piloto, 18 das 31 escolas do distrito adotaram o “intervalo antes do almoço”.

Desafios

A mudança trouxe alguns desafios. Como as crianças vinham direto do pátio, a escola teve de instalar higienizadores de mão no refeitório. Até que o sistema do almoço fosse computadorizado, a escola teve de distribuir cartões às crianças conforme elas retornavam do intervalo.

Em Montana, autoridades de escolas estaduais estavam buscando maneiras de aprimorar os hábitos de alimentação e atividades físicas das crianças, e conduziram em 2002 um estudo-piloto em quatro escolas de “intervalo antes do almoço”. De acordo com um relatório do Programa de Nutrição em Grupo de Montana, as crianças que brincavam antes do almoço desperdiçavam menos comida, bebiam mais leite e pediam mais água. Assim como no Arizona, os alunos ficavam mais calmos quando retornavam às salas de aula, resultando em aproximadamente 10 minutos adicionais de tempo de aprendizado.

Um desafio do programa era ensinar as crianças a comer mais devagar. Antes, elas terminavam o almoço na cantina em cinco minutos para poderem iniciar o recreio. Com a mudança, os funcionários da cantina tinham de estimulá-los a desacelerar, mastigar sua comida e usar todo o tempo disponível restante para terminar seu almoço.

Hoje, cerca de um terço das escolas de Montana já adotou o “recreio antes do almoço”, e autoridades estaduais dizem que mais escolas estão sendo estimuladas. “Os projetos-piloto em andamento demonstraram que os alunos estão desperdiçando menos comida, eles possuem um ambiente de alimentação mais relaxado e melhoraram o comportamento por não estarem com pressa de sair”, disse Denise Juneau, superintendente do Escritório de Educação Pública. “Isso é algo que nosso escritório irá promover às escolas de todo o estado como uma prática recomendada.”

Especialistas em saúde infantil apontam que essa mudança pode não funcionar em muitos distritos escolares urbanos, onde crianças de baixa renda podem começar o dia com fome.

“É uma ótima ideia, mas primeiro temos de lhes proporcionar um café da manhã decente”, disse David Ludwig, diretor do programa de obesidade do Hospital Infantil de Boston. “Muitas crianças pulam o café da manhã e estão famintas na hora do almoço.”

Para uma mudança aparentemente simples de agenda, isso pode criar assustadores problemas logísticos. As crianças muitas vezes têm de voltar aos corredores e salas de aula após o intervalo, para ir ao banheiro, lavar as mãos e buscar suas lancheiras. A Escola Primária North Ranch recebe regularmente chamadas de escolas em climas mais frios, com perguntas sobre como lidar com casacos, gorros, botas e luvas. “No Arizona, não temos esse problema”, disse Hartley, a diretora.

Muitos distritos escolares dizem que tais problemas trazem relutância em realizar a mudança. Um estudo de 2006, publicado no Journal of Childhood Nutrition & Management, relatou que menos de 5% das escolas primárias do país estavam agendando o recreio parao antes do almoço.

Porém, na Escola Primária Sharon, a diretora, Sinkewicz, diz que os desafios valeram a pena. Antes, as crianças levavam casacos, gorros e luvas com eles à cantina, e depois saíam. Agora elas têm tempo de levar os casacos de volta aos armários, para não precisarem carregá-los para o refeitório.

“Por alguma razão, as crianças não estão perdendo coisas lá fora”, disse Sinkewicz. “A montanha de achados e perdidos está cada vez menor.”

 

TARA PARKER POPE
do New York Times

Publicado no UOL

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